sexta-feira, 30 de janeiro de 2009

Xadrez Paisagista ... com nevoeiro

imagem de Fernando Reis: xadrez Paisagista

Nevoeiro

Nem rei nem lei, nem paz nem guerra,
Define com perfil e ser
Este fulgor baço da terra
Que é Portugal a entristecer -
Brilho sem luz e sem arder,
Como o que o fogo-fátuo encerra.

Ninguém sabe que coisa quer.
Ninguém conhece que alma tem,
Nem o que é mal nem o que é bem.
(Que ânsia distante perto chora?)
Tudo é incerto e derradeiro.
Tudo é disperso, nada é inteiro.
Oh Portugal, hoje és nevoeiro...
É a Hora!

Fernando Pessoa in PESSOA, F. 1988. Nevoeiro. A Mensagem. terceira parte - o encoberto; III - os tempos; quinto - Nevoeiro. Círculo de Leitores, Pub. D. Quixote e Jorge Martins.

Atravessamos tempos difíceis.
Daqueles que nos põem à prova realmente, como o fizeram com os nossos antepassados todos (é só atirar seixos de dúvida para a superfície da história para podermos ver as suas ondas de choque), e isto não se resume a um sector da sociedade, nem a umas quantas actividades – há que chegue para todos, até para nós, Paisagistas.

Pelos ecos que me chegam diariamente, não há “trabalho”, pelo menos para a maioria de nós, e o que há, já está destinado à partida e mesmo assim nunca é pago pela tabela do nosso esforço – é espantoso como até neste campo é difícil um consenso ou uma norma, uma regra, uma orientação que regule a treta do mercado que existe, com custos de projecto a valer entre 4 a 5 € por hora ou 6% de 15 a 17 € por metro quadrado, muito abaixo do tabelado (que já não é), e mesmo estes era bom que fossem pagos, pelo menos a horas.
Podia acrescentar acerca deste assunto, e entre outros, o desajustamento e desadequação de partes importantes dos curricula universitários em relação ao mercado global actual; o trabalho escravo que se esconde atrás de palavras pomposas como “estágio curricular”; a forma ... como alguns concursos são ganhos; o negócio oculto, com plantas, materiais ou vistorias que ronda os projectos, etc., etc., etc. mas como aparentemente não existem (que eu saiba, ainda não foi cancelada a licença para exercer a profissão a ninguém), fico por aqui nestas considerações. Se calhar enlouqueci de vez e estou a ter alucinações…
Como se diz no poema, está na hora de por as mãos no problema da Arquitectura Paisagista nacional e agir. Não sei como, porque o processo depende de todos, principalmente da APAP que tem, pelo menos, a obrigação moral de se mexer, quanto mais não seja por respeito ás propostas da lista perdedora nas últimas eleições e que deixaram para trás um rasto de Ordem que pode ser uma solução interessante se houver interesse real pelos responsáveis em coordenar, regularizar e defender as acções dos seus membros (para o bem e para o mal), e refiro-me a uma intervenção de fundo que passe desde os curricula universitários, aos estágios, aos concursos para contratações (principalmente no sector púbico – e fica aqui a promessa de um dia revelar as estatísticas que eu próprio estou a construir acerca do envio para todos os municípios portugueses do meu CV… ainda estou em estado comatoso com algumas respostas), aos … enfim, tudo.

Penso sinceramente que este, se calhar, é o tempo de parar tudo e recomeçar de novo. Ao esforço dos “Pais” Paisagistas que definiram e implementaram esta profissão em Portugal é necessário e urgente acrescentar o esforço de regulamentar, coordenar e dirigir com traço firme e sério o futuro da profissão entre nós.

Vai uma aposta em como ainda vamos a tempo?

(por falar em tempo, não posso também de deixar de passar esta oportunidade para me questionar o que fará a APAP há dois meses com os documentos que enviei para efectuar a minha inscrição na Associação. Bem sei que não são obrigados a aceitar qualquer um – eu próprio também já não tenho idade para aceitar qualquer coisa – mas caramba! Pelo menos deveriam ter a hombridade de o justificar – porque eu não encontro justificações válidas para tanta demora. Fica o provérbio popular de autoria, para mim, desconhecida: “os bois são lentos, mas a Terra é paciente”).

Façam então o favor de reler o poema do Sr. Pessoa e usem bem a massa cinzenta que tiverem entre as orelhas.

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